quarta-feira, 27 de outubro de 2010

DEMISSÃO - O ÚLTIMO RECURSO

Organizando alguns materiais aqui em casa, encontrei um texto de Stephen Kanitz de 2001, sobre um tema sempre actual, demissão e decidi partilhar com todos vocês. Aqui em Portugal, é o assunto da vez, por conta da crise.
Eu levanto a seguinte questão, que é partilhada por muitos autores como os portugueses Miguel Pina e Cunha Arménio Rego e outros, no livro Organizações Positivas - Manual de Trabalho e Formação. Será que demitir é o melhor a se fazer? Se for necessário realmente como fazer isso com mais humanismo? Toda empresa tem uma responsabilidade social muito grande com todos seus trabalhadores.
Ser demitido é um dos momentos mais dolorosos na vida de um ser humano, imagine não ser demitido com dignidade... como por exemplo por telegrama, por telefone ou por e-mail. Sim estas são algumas das formas desumanas e indignas de dizer para um trabalhador que ele não será mais necessário na Organização e algumas empresas ainda o fazem, como a Groudforce (empresa controlada pela TAP) fez no Faro(Portugal) despedindo 336 funcionários por e-mail.
Não vou entrar no mérito do que vem acompanhado com a demissão, como o sentimento de incapacidade, de menos valia, tristeza, depressão. Isto daria uma outra postagem e vale abordar o assunto em breve e eu o farei com certeza. Quero apenas lembrar que este é um dos temas mais delicados quando se trata da gestão das pessoas nas organizações. Concordam?
Tenho um exemplo de empresa que se recusou a seguir na onda do que estava a acontecer no momento de "crise". Após o 11 de setembro muitas empresas americanas entraram em colapso e a medida imediata que muitas encontraram foi demitir. A Southwest Airlines(SWA) companhia aérea, se recusou a fazer demissões em massa. Por que? Talvez por que a não visasse apenas o curto prazo.
Com a crise mundial de 2008, muitas empresas no Brasil tiveram como primeira opção a demissão. Desperdício de talentos? Precipitação? Única Opção? São muitas as hipóteses. É um assunto que dá margem para muita reflexão para todos nós profissionais de recursos humanos.
Lembrei do filme "Up in the air" onde a questão demissão é abordada e recomendo para quem não viu. O actor George Clooney interpreta um executivo especializado em demitir pessoas ao redor do mundo. Sua empresa para diminuir custos com suas inúmeras viagens, hotéis, etc, decide contratar uma executiva jovem, que apresenta uma "solução fantástica" para a empresa: demitir as pessoas via web cam pela internet. Claro que a situação não é tão simples, pois estamos lidando com pessoas, seus sentimentos e emoções, anos de dedicação, amor ao trabalho, medos angústias. O filme teve inúmeras críticas pois não é uma história de amor, só que o título em português faz menção a um filme romântico, nada a ver. Como profissional de RH, penso que nos abre espaço para pensar sobre o tema. Recomendo.
Aguardo comentários.

Você Está Demitido!

Stephen Kanitz

Você é diretor de uma indústria de geladeiras. O mercado vai de vento em popa e a diretoria decidiu duplicar o tamanho da fábrica. No meio da construção, os economistas americanos prevêem uma recessão, com grande alarde na imprensa.

A diretoria da empresa, já com um fluxo de caixa apertado, decide, pelo sim, pelo não, economizar 20 milhões de dólares. Sua missão é determinar onde e como realizar esse corte nas despesas.

Esse é o resumo de um dos muitos estudos de caso que tive para resolver no mestrado de administração, que me marcou e merece ser relatado. O professor chamou um colega ao lado para começar a discussão. O primeiro tem sempre a obrigação de trazer à tona as questões mais relevantes, apontar as variáveis

críticas, separar o joio do trigo e apresentar um início de solução.

"Antes de mais nada, mandaria embora 620 funcionários não essenciais, economizando 12 200 000 dólares. Postergaria, por seis meses os gastos com propaganda, porque nossa marca é muito forte. Cancelaria nossos programas de treinamento por um ano, já que estaremos em compasso de espera. Finalmente, cortaria 95% de nossos projetos sociais, afinal nossa sobrevivência vem em primeiro lugar".

É exatamente isso que as empresas brasileiras estão fazendo neste momento, muitas até premiadas por sua "responsabilidade social".

Terminada a exposição, o professor se dirigiu ao meu colega e disse:

-Levante-se e saia da sala.

-Desculpe, professor, eu não entendi - disse John, meio aflito.

-Eu disse para sair desta sala e nunca mais voltar. Eu disse: PARA FORA!

Nunca mais ponha os pés aqui em Harvard.

Ficamos todos boquiabertos e com os cabelos em pé. Nem um suspiro. Meu colega começou a soluçar e, cabisbaixo, se preparou para deixar a sala. O silêncio era sepulcral. Quando estava prestes a sair, o professor fez seu último comentário:

-Agora vocês sabem o que é ser despedido. Ser despedido sem mostrar nenhuma deficiência ou incompetência, mas simplesmente porque um bando de prima-donas em Washington meteu medo em todo mundo.

Nunca mais na vida despeçam funcionários como primeira opção. Despedir gente é sempre a última alternativa.

Aquela aula foi uma lição e tanto.

É fácil despedir 620 funcionários como se fossem simples linhas de uma planilha eletrônica, sem ter de olhar cara a cara para as pessoas demitidas.

É fácil sair nos jornais prevendo o fim da economia ou aumentar as taxas de

juros para 25% quando não é você quem tem de despedir milhares de funcionários nem pagar pelas conseqüências.

Economistas, pelo jeito, nunca chegam a estudar casos como esse nos cursos de política monetária.

Se você decidiu reduzir seus gastos familiares "só para se garantir", também estará despedindo pessoas e gerando uma recessão.

Se todas as empresas e famílias cortarem seus gastos a cada previsão de crise, criaremos crises de fato, com mais desemprego e mais recessão.

A solução para crises é reservas e poupança, poupança previamente acumulada.

O correto é poupar e fazer reservas públicas e privadas, nos anos de vacas

gordas para não ter de despedir pessoas nem reduzir gastos nos anos de vacas

magras, conselho milenar. Poupar e fazer caixa no meio da crise é dar um

tiro no pé.

Demitir funcionários contratados a dedo, talentos do presente e do futuro, é suicídio.

Se todos constituíssem reservas, inclusive o governo, ninguém precisaria ficar apavorado, e manteríamos o padrão de vida, sem cortar despesas.

Se a crise for maior que as reservas, aí não terá jeito, a não ser apertar o cinto, sem esquecer aquela memorável lição: na hora de reduzir custos, os seres humanos vêm em último lugar.

Artigo Publicado na Revista Veja, edição 1726, ano 34, nº45, em 14 de Novembro de 2001.


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